Ritmo


papai pode

dalai lama

(para perceber todo o seu efeito coativo, repetir algumas vezes a leitura em voz alta dos dois versos, marcando uma pequena pausa entre eles)

O que nos engata no mecanismo destes dois versos, como uma engrenagem na outra, é essa espécie de mímica do espírito, empatia de movimento, mimetismo da forma, à qual não só a rima, mas também o ritmo nos impele. Esses dois versos de rima só interna, de sentido totalmente desconexo, engatam-se um no outro, e nos carregam nesse engate, apenas pelo ritmo. Dessa forma, o ritmo nos subjuga. Pode ser até que nos acalme, divirta; de todo modo, o ritmo nos afeta. Por isso diz Nietzsche que "o ritmo é uma coação"*; e Ricardo Reis que, devido ao ritmo, a poesia é mais disciplinada que a prosa, mais disciplinadora**. Nisso, o ritmo talvez seja superior ao sentido, e com certeza o é à rima. Sentido, rima e ritmo, três elementos da poesia, três operadores de nossa adesão ao texto, à fala e ao real, três agenciadores de nosso assujeitamento ao mundo.

(*) NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. Trad. Paulo César Lima de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2002 [1882]. #84, Da origem da poesia.
(**) PESSOA, Fernando. Obra poética. 3 ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005. Pp. 297-298.

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