Nomadismo intelectual


Michel Foucault é um grande nômade intelectual. Num experimento de pensamento, ocupa momentaneamente uma posição. Depois, ressurge em outra, que pode até nos aparecer, a nós que nos acostumamos a pensar a partir de comparações entre pontos fixos, como oposta à primeira.

A metamorfose é o nomadismo das figuras (morphé).
A máscara, um ponto fixo, uma idéia fixa que se mostra, e oculta quem está sob ela.
A metamorfose é uma duração.
A fotografia, uma máscara, que retira o ser da “correnteza”.

Experimentos de Foucault (nomadismo intelectual): desmascarar-se ou trocar de máscara?



Ética/moral

A liberdade mesma seria imoral...

Veja-se então toda a vantagem, a grande vantagem, em se distinguir ética de moral... e toda a astúcia daqueles que se esforçam em suprimir essa diferença.



Divisor moral/imoral em sua chave econômico-política


Ao final, talvez concluíssemos que tudo o que nós chamamos de moral nada mais é do que a parte de atitude e de atividade ajustadas à obediência (que possibilita a dominação política) e ao serviço (dominação econômica).

E que o imoral, então, reserva a parte oposta: o desajuste resistente à dominação, na atitude e na atividade.

Aquela disposição índia, aquela preguiça incontrolável e irregular, seria acima de tudo imoral! A liberdade mesma seria imoral....

[...] a produção industrial [...] requer um trabalho enérgico, intenso, contínuo – em suma, a qualidade moral do trabalhador. 
FOUCAULT, Michel. La société punitive: Cours au Collège de France, 1972-1973. Paris: Seuil/Gallimard, 2013 [1973]. P. 197.






Sociedade de controle


Fez-se apelo ao Estado para “controlar e corrigir” a imoralidade de uma classe pervertida pelos maus hábitos, degenerada, selvagem, estrangeira à própria sociedade. Parece que esse ideal de correção foi abandonado. Ficando apenas o de controle.




“[...] maîtriser et corriger [...]”. FOUCAULT, Michel. La société punitive: Cours au Collège de France, 1972-1973. Paris: Seuil/Gallimard, 2013 [1973]. P. 175.

Robôs

Para Spinoza: “[...] todos [os indivíduos], mesmo que em graus diversos, são animados [...]”*. Tudo pensa (entende, tem ideias, sente, imagina, percebe) com maior ou menor gama de intensidades. O pensamento é infinito. Tudo tem mente ou alma, é animado, ou seja, vive. A vida não é um privilégio orgânico ou biológico. A vida é um operador existencial.

http://www.nytimes.com/2015/06/18/technology/robotica-sony-aibo-robotic-dog-mortality.html?emc=edit_th_20150618&nl=todaysheadlines&nlid=44029019


(*) e2p13cs. Ethica, escólio que se segue ao corolário da proposição 13 da segunda parte.

Educação, condição performativa da ética?

Dissociar educação e ética. 

A educação se obtém pelo ensino. A ética não seria, de imediato, um processo educativo, mas, primeiro, um processo de deseducação, se o objeto do ensino fosse assim definido: “paciência, trabalho, sobriedade, frugalidade, religião, isto é o que precisa ser ensinado”*.




(*) E. Burke apud FOUCAULT, Michel. La société punitive: Cours au Collège de France, 1972-1973. Paris: Seuil/Gallimard, 2013 [1973]. P. 110.



Info: Pensamento-cinema 4 – 2015.1


pensamentocinema.blogspot.com.br


Info: Calibã


Brasil: prisioneiros de guerra

População carcerária: 700.000
População geral: 200.000.000

1 corpo preso para cada 286 corpos.


A razão e a história


Se isso é assim, quer dizer, se a razão é uma operação da consciência humana, então, a razão nunca opera por trás dessa consciência. A razão nunca faz dos humanos o meio involuntário e inconsciente de sua realização histórica. Não há razão inconsciente.



A origem da arte


Bazin situa a origem das artes plásticas no princípio orientador da “prática do embalsamento”. Trata-se, desde o início, de uma aspiração psicológica: o desejo de lutar contra a morte. A representação da realidade viva pela arte pretende salvar o ser pela fixação da sua aparência pictórica ou estatuária. Fixar o ser pela aparência e retirá-lo do devir: da “correnteza da duração”*.

Então, curiosamente, podemos pinçar, na origem da arte, a vigência de um princípio conservador. Mas, ora, o artista não é geralmente o inovador? E a arte, ela não está ligada à inovação? Há, aí, apenas, a inovação da conservação.

Aliás, tudo o que se fixa visa a se conservar. Toda memória. E portanto toda a consciência (como diria Bergson). E portanto toda ideia da razão. Tudo isso é fixação, conservação.



(*) Conferir: BAZIN, André. Ontologia da imagem fotográfica [1945]. Trad. Eloisa Araújo Ribeiro. In: O que é o cinema?. São Paulo: Cosac Naify, 2014 [1985]. P. 27-34.

Razão e memória


Mas Bergson pensa que “a consciência é antes de tudo uma memória”*.






(*) MIRAVÈTE, Sébastien. Bergson et l’invention de la durée. In: BERGSON, Henri. Essais sur les données immédiates de la conscience. Paris: GF Flammarion, 2013 [1889]. P. 261.

Razão e consciência


Aos poucos, tenho compreendido a Razão apenas sob a forma da consciência racional, ligada a uma certa atividade mental consciente. A Razão, assim compreendida, nunca é silenciosa, nem estática, nem inerte, como uma faculdade mental que poderia estar adormecida; ela é sempre uma operação atual, atenta de si mesma.

As distinções racionais (que se efetuam pelo jogo da distinção de elementos considerados opostos) são sempre distinções da consciência.

Afinal, “nas camadas profundas da atividade mental inconsciente os opostos não são diferenciados um do outro, mas sim expressos pelo mesmo elemento”*.

Sendo assim, resta um fundo mental enorme e ambíguo, pois a consciência é apenas a estrutura superficial do pensamento [ou do que Freud chama de “psíquico”], apesar de ser a mais aparente (pela proximidade a si mesma).




(*) FREUD, Sigmund. Resumo da psicanálise [1924]. Trad. Paulo César Lima de Souza. In: O eu e o id, “Autobiografia” e outros textos. Obras completas. Vol. 16 (1923-1925). São Paulo: Companhia das Letras, 2011. P. 245. Grifo meu.


O que faz o filósofo?

Bom, ele busca colocar o pensamento em ordem. Produzir e arrumar as ideias de tal maneira que elas não briguem muito umas com as outras. 

Mas logo o filósofo percebe quão difícil é esse arranjo ordenado das ideias. Chega mesmo a suspeitar de que a desordem no pensamento seja uma característica do pensar. E passa a desconfiar de quem afirma ter o pensamento em ordem. 

Quem diz ter tudo em ordem não quer, na verdade, dar as ordens?