Ser da língua

Se a língua tem uma potência, se ela é capaz de desdobramentos ou efeitos, então há um ser da língua, mesmo que apenas imaginário (um engajamento das ideias da imaginação dos falantes da língua).

Poetar

O que fazem os poetas?

Eles escrevem, isto é, eles desobstruem os caminhos de desdobramento da potência própria de uma língua.

Tudo começa pelo método II

O vetor Foucaut-Spinoza (na sua não-modernidade) atropela, a contrapelo, a história (essa figura tão moderna).

Veja isso em: Tudo começa pelo método I.

Lutar, dançar


*


Até quando insistiremos em lutar com os anjos? Quando, enfim, começaremos a dançar com eles?

(*) Detalhe de um Delacroix (Église de St. Sulpice, Paris)

Tentativa de distinção entre as ontologias

Uma ontologia é qualquer discurso ordenado, ou melhor, qualquer ordem discursiva sobre o ser.

A metafísica é uma ontologia em que os fundamentos do discurso ontológico são considerados unicamente intelectuais e acessíveis à inteligência humana pela luz natural.

A teologia é uma ontologia, mas não é uma metafísica, na medida em que encontra os fundamentos do seu discurso numa revelação, por luz sobrenatural, que vai além da potência intelectual humana considerada em si mesma.

Além da teologia e da metafísica, outras ontologias são possíveis, como aquelas parciais das ciências empíricas.

Uma distinção possível entre individualização e individuação

O processo de individualização se distingue de um processo de individuação por isso que o resultado imaginário do primeiro processo é o indivíduo moderno, como sujeito soberano e autofundamentado, enquanto o resultado do segundo é uma singularidade que não tem seu fundamento em si mesma.

Poder real a partir de uma potência imaginada




Numa comparação crua, direta, uma vaca tem uma potência física muito maior que a de um ser humano. Entretanto, ela imagina o ser humano com uma potência física maior que a sua e, por isso, numa situação normal, foge dele, e nessa fuga se deixa governar por ele. Por quê? Talvez por uma peculiaridade de sua lente ótica, que a faça ver o humano muito maior do que de fato ele é, ou de seu ouvido, que a faça ouvi-lo como se fosse um monstro.

Liberdade e segurança

Na nossa atual ideia disposta de política, trocamos liberdade por segurança. Isto é, o tempo todo, aceitamos ceder de nossa liberdade [o que ressentimos como um mal] em troca da segurança do nosso corpo [que consideramos um bem maior].

Mas, na realidade da coisa, liberdade e segurança não se contrapõem. Pois não se pode reduzir a liberdade sem reduzir, junto, a segurança. 

Um regime político, um viver sob regras comuns a todos, que não envolva a liberdade de viver é inseguro.

É fácil fazer a máquina girar no vazio

O império de Wittgenstein – “do que não se pode falar, deve-se calar” – é vão!
“Nem os mais peritos (muito menos a plebe) sabem se calar! Este é um vício comum aos humanos: confiar a outros suas reflexões (consilia), mesmo quando é preciso silêncio.”*

(*) SPINOZA, Benedictus de. Oeuvres III: Traité théologico-politique. Trad. Jacqueline Lagrée et Pierre-François Moreau. Paris: PUF, 2009 [1670]. XX, §4. P. 635.

Nexus III – nexo na aparência, não no nome








Van Gogh: http://pintura.aut.org/SearchProducto?Produnum=2969 &
Alexander Semenov: http://clione.ru/gallery/lab

Um deus finito


Deus é a razão da concepção intelectual das coisas naturais, conforme o dito:
|Tudo isso que (Quicquid)| é |em Deus é (in Deo est)|, e nada sem Deus ser, nem concebido-ser (concipi), pode. (e1p15)
Um Deus infinito (por definição: um ente constituído de infinitos atributos) é a razão da concepção de infinitas coisas:
A partir da necessidade (Ex necessitate) da divina natureza (divinae naturae), infinitas [coisas] de infinitos modos (infinita infinitis modis), isto é, todas [as coisas], as quais sob [o] intelecto infinito (sub intellectum infinitum) cair (cadere) possam, se-seguir devem (sequi debent). (e1p16)
Podemos ter uma intuição dessas duas proposições, a partir de uma quimera inteligível – um deus finito.

Seja um deus finito cujos atributos sejam apenas: 
1) a quadrilateralidade constante, cujas partes componentes são:
2) uma metade verde
3) um quarto azul
4) um quarto amarelo

Dada essa definição divina, apenas 16 modos a podem exprimir.
Cada um desses modos exprime o Deus finito, que é a sua razão de ser e de se conceber.
Cada um dos modos envolve a ideia do seu Deus finito.

Nexus II

Eu uso nexus para designar o elo estudado por Foucault entre sujeito, verdade e poder. 

Spinoza, numa abordagem ontológica, usa nexus para designar o encadeamento causal: “L’Esprit comprend que toutes les choses son nécessaires et sont déterminées à exister et à opérer par le nœud infini des causes (infinito causarum nexu)”. Ethica. Démonstration de la proposition VI, partie 5.

Outros usam nexus por ainda outras razões (por mim desconhecidas).




Ética do olhar II


Assim, olhar para cada coisa natural do mundo como se ela fosse, em si mesma, um céu absolutamente azul claro e sem nuvens.

A coisa: a dobra, o giro, o modo de individuação II


A dobra é uma inversão singular em que o envolver causas se torna exprimir efeitos. Quanto mais potência a dobra envolve, mais potência ela exprime. Esta é sua intensidade.

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Tenho a impressão que estamos perdidos por estarmos em um mundo em que não podemos mais nos perder.