O acontecimento do dia de hoje: o rasto estreito de uma vermelhidão refletida no mar. Não havia sol. O reflexo, pode-se supor, tinha origem num buraco entre as nuvens. Mas a conexão entre o buraco no céu e o traço vermelho no mar era apenas contingente, uma exigência para se evitar a possibilidade da alucinação e do nonsense. Não parecia – e talvez não fosse – uma conexão real. O traço era como um trilho de luz vermelha que se estreitava retilíneo na direção do Oeste, o buraco nas nuvens de chumbo estava alto, muito mais à direita, era claro, mas não tão vermelho. O fenômeno efêmero durou uns dois minutos, o vermelho no mar logo foi se esvaindo. Eu poderia não tê-lo visto.
O dia de hoje não é o hoje-em-dia. O dia de hoje é uma singularidade, um acontecimento, um dia histórico, uma facticidade. Não é um universal, uma condição, um transcendental nem uma gramática. O dia de hoje é contingente, eu poderia não tê-lo visto.