Mecanismos afetivos XV – desejo e poder
Não apenas nós não queremos
ser governados desse jeito, por essa ou por essas pessoas; nós queremos
mais do que isso – nós queremos governar.
Quiasma língua_pensamento II
Há uma linguagem para pensar, assim como para
falar. Isso não quer dizer que pensemos apenas com palavras.
Ruptura e liberdade
Toda ruptura é um movimento das vontades, portanto, uma manifestação da liberdade.
Pórem, isso que se rompe não é necessariamente mais livre do que aquilo que foi rompido.
As rupturas são livres. Mas esse movimento não implica um crescendo na liberdade.
Porque os estágios de uma ruptura, o antes, o depois, são incomensuráveis.
Pórem, isso que se rompe não é necessariamente mais livre do que aquilo que foi rompido.
As rupturas são livres. Mas esse movimento não implica um crescendo na liberdade.
Porque os estágios de uma ruptura, o antes, o depois, são incomensuráveis.
Espiritualidade, nexus, política II
A vontade de um nexus outro não é atribuível somente ao sujeito. Não é o sujeito que quer
a ruptura, quer dizer, não é o sujeito que a quer em primeiro lugar. Não é a
vontade do sujeito sozinho que quer a ruptura. É a vontade constituinte do nexus ainda-não já-presente (que envolve a
vontade dos sujeitos na vontade de um mecanismo de poder, na vontade de um
regime de verdade). É a outra articulação das
vontades que rompe a articulação presente.
O objeto da vontade do sujeito só se
constitui numa técnica, numa prática. Isso que o sujeito quer é efeito de um
modo de objetivação. Este modo de objetivação (junto com os modos de assujeitamento
e de subjetivação) é componente de um nexus.
Assim, na “espiritualidade política”, na vontade de ruptura de um nexus, já deve estar presente, embora ainda não de maneira dominante, a
vontade de um nexus outro.
Todos estes termos (vontade, sujeito,
poder, verdade, nexus), porém, não apontam para entidades, não têm entidade. Só ganham entidade numa ontologia. Mas
toda ontologia é uma ficção.
Guias e advertências II
O que mais faz um guia além de nos advertir (fazer com que nossa atenção se verta para isso ou para aquilo)?
Guias e advertências
Quando tomamos um guia, já estamos
advertidos? Ou as advertências se seguem ao encontro desse guia?
Mesmo previamente advertidos... tomar radicalmente
um guia significa abandonar todos os preconceitos (e advertências) anteriores a
este guiamento.
O espectador imaginário
Uma vez ou outra, num lampejo, eu percebo que eu arranjo meu cenário como se houvesse no teatro, além de mim mesmo, um outro espectador.
Deixar você na cara do gol II
É fácil reconhecer um amigo naquele que considera
um amigo um amigo seu.
M. de Charlus: “...não posso condenar em
bloco... uma nação que conta com Spinoza entre suas crias ilustres...”.
PROUST, Marcel. Sodome
et Gomorrhe I et II. Paris: Le
Livre de Poche, 1993 [1922]. P. 606.
Deixar você na cara do gol
Logo antes de recomeçar (mais uma vez) com Spinoza,
por coincidência ou não, recebo este passe de M. de Charlus:
“...não posso condenar em bloco... uma nação
que conta com Spinoza entre suas crias ilustres...”
PROUST, Marcel. Sodome et Gomorrhe I et II. Paris: Le Livre de Poche, 1993 [1922]. P. 606.
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Um texto se escreve letra após letra, nem sempre em sequência, mas quando termina, termina todo de uma só vez.
O pensamento é inconcluso
Por exemplo –
Eu meço o que faço, em minha obediência a um
outro, à medida que imagino isso que um outro quer que eu faça. Nessa
imaginação, porém, eu faço outra coisa (a mais, a menos ou totalmente
diferente) do que isso que um outro me manda fazer. Não penso que assim eu
obedeça só a mim mesmo, mas que obedeço à imagem do outro em mim.
Pensado e pensamento
O pensado parece algo já adquirido, um fundamento.
O pensamento algo que ainda-não é um pensado.
O pensamento algo que ainda-não é um pensado.
Da realidade do tempo
o tempo
tem sua realidade
na
força de atração
entre o já e o ainda-não
já é ainda-não
ainda-não é já
devir
tem sua realidade
na
força de atração
entre o já e o ainda-não
já é ainda-não
ainda-não é já
devir
Vontade e devir
o que eu quero?
algo que ainda-não
algo que já
no jogo entre o ainda-não
e o já
– dá-se o devir
Afinal, o que você quer?
Afinal, o que você quer? Nadar ou atravessar
a piscina?
O pragmático: – atravessar a piscina, chegar
do outro lado.
O romântico: – nadar, nadar para sempre.
Nadar e atravessar a piscina. Atravessar a
piscina, nadando.
O que eu quero não é diferente (não está somente depois, nem totalmente junto) do que faço.
Explicitações inconclusivas
À medida que eu faço, ordenam-me dizer isso que
eu estou fazendo. Mas, ao dizer isso, ainda estou fazendo alguma coisa que também
precisa, segundo aquela mesma ordem, se tornar explícita.
Tudo é conclusivo, mas ilimitadamente
De todo texto, como de tudo e de qualquer coisa,
podemos concluir algum texto ou alguma coisa. Esta conclusão (que deveria ser
um final) é também (no entanto) um texto, que por sua vez (enquanto tal) possui
uma conclusão. Et sic in infinitum.
É impossível individualizar o primeiro a chegar
Os matemáticos Iorg Huygens e Iakhish Kharamazam, em dois artigos escritos de maneira independente, mas simultaneamente publicados em uma mesma Revista, a Off-Shore International, afirmam que, em festas com hora marcada para começar, para as quais o número de convidados ultrapasse 2 mil pessoas, não há um convidado que seja o primeiro a chegar. Para cada convidado que chega, é sempre possível identificar um outro que já estava lá antes dele.
A comunidade científica internacional encontrou dificuldades para classificar os dois artigos nas sub-categorias comuns da matemática, como a estatística ou a probabilidade. “Poderia tratar-se também de uma descoberta física”, afirmou o especialista Hjin Piao.
O nome comum é um gênero? Ou um exemplo?
“Isto é um
cachorro”.
Para os
gramáticos, isso quer dizer: “isto”, este corpo individual, pertence à espécie
(ou ao gênero) dos “cachorros”. (Alguns, mais experimentados, vão até afirmar
que esta espécie existe.) (Mas onde? Perguntam-se os menos experimentados.)
Contudo, talvez, com “isto
é um cachorro” eu quisesse dizer apenas que “isto” é exatamente “isto”, sendo o
primeiro “isto” diferente do segundo (que é apenas um exemplo disto que “isto” de fato é).
Quem sabe, não falamos por meio do gêneros, mas por meio de exemplos?
Quem sabe, não falamos por meio do gêneros, mas por meio de exemplos?
Como quando
digo: “esta parede é azul”.
Esta parede é
ela mesma. Ela é de uma coloração variada, múltipla, entretanto, eu digo que
ela é, por exemplo, azul. Mas azul não é um gênero; sim, uma cor certa e
determinada, que tomei como exemplo, entre inúmeras outras, ali, nesta parede.
Monocromatismo monocrático
“Esta parede é azul”.
Na pintura desta parede – trata-se sempre de um exemplo –, podemos de fato reconhecer inúmeras
tonalidades, mas somos coagidos a dizer que esta parede é de uma só cor.
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