Temos aquelas definições antigas de cidade como lugar da liberdade. A cidade é o lugar intramuros onde os cidadãos exercem sua liberdade.
Agora remeto-me não a definições, mas àquelas imagens da antiga prisão de Carandiru, de grades e celas abertas, de certo comércio entre os prisioneiros, de certa circulação, de aparente liberdade intramuros. Mas, obviamente, Carandiru não é uma cidade. E não se pode, em absoluto, falar de uma certa liberdade em Carandiru. Carandiru é uma prisão. E, em princípio, Carandiru faz parte da cidade. Carandiru, em São Paulo.
Deixemos, então, por um momento, a definição da cidade como espaço da prática da liberdade. Senão Carandiru seria uma espécie de cidade. Tomemos, entretanto, a posição da guarda, relativamente ao muro. Na cidade, a guarda vigora a partir de dentro dos muros que contornam a cidade. A guarda garante a muralha que desenha a cidade, e que assim lhe dá seu aspecto, sua forma de cidade. Na cidade, a guarda está, junto aos cidadãos, no lado de dentro da muralha. Relativamente aos prisioneiros, ao contrário, a guarda está do lado de fora da muralha que dá forma à prisão. Em relação ao espaço da prisão, a guarda também garante a muralha, mas, dessa vez, do lado de fora, apartada dos prisioneiros e não junto a eles.
Agora, tudo parece se encaixar. O muro cerca a cidade, não a prisão. O espaço da prisão é um fora, não um dentro. A liberdade é sempre intramuros. A guarda está junto aos cidadãos; no interior dos muros, garante da liberdade. Na prisão, não há liberdade nem, propriamente falando, uma guarda. A prisão não pertence à cidade, não é um lugar cercado. A prisão não tem, por si mesma, uma forma. A prisão é o fora da cidade, ela sim cercada. Cercada é a liberdade. Relativamente ao contorno do muro, a cidade está onde está a guarda.
Assim, podemos definir a cidade pela posição da guarda, relativamente ao muro.
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