Parciais IV – E tudo isso, consciência de si, alma e corpo...

Tenha-se em mente o comentário de Guéroult, ao qual, no mesmo viés, acrescento (sem nada somar):

A alma é ideia do corpo. Mas ela não conhece o corpo em si mesmo. Apenas percebe o que ocorre no corpo, suas afecções, isto é, o efeito no corpo da relação entre a natureza do corpo e a natureza dos outros corpos, a natureza em geral.

A ideia da alma está para a alma como a alma está para o corpo. Ela percebe a alma, embora não a conheça em si mesma. Ela percebe a alma, mas apenas na medida em que a alma é ideia do corpo, isto é, apenas na medida em que a alma percebe o corpo na sua relação com outros corpos.

A alma é ao mesmo tempo percepção de si mesma e percepção do corpo, ou seja, através dele, percepção dos outros corpos.

E tudo isso, consciência de si, alma e corpo, além de se darem simultaneamente, são, ontologicamente, expressões da mesma coisa, sob diferentes aspectos.

Suprimida a natureza ou o suprimido o corpo, na sua duração e existência, suprime-se a alma enquanto ideia deste corpo, e enquanto consciência de si mesma, mas não se suprime o ser da alma, como não se suprime o ser do corpo. Pois ser e existir não estão, na coisa singular, necessariamente vinculados – o ser da coisa não é causa do existir da coisa. A causa do existir da coisa é o encadeamento causal infinito da existência das outras coisas. A existência da coisa em relação ao seu ser é contingente, isto é, dado o ser da coisa, sua existência não se segue necessariamente. A causa do ser da coisa é Deus.

Assim, Deus é causa tanto do ser quanto da existência da coisa. A coisa é uma expressão de Deus. E a coisa se expressa simultaneamente como corpo que é e que existe, como alma que é e que existe.

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