O ego ou a consciência
de si se forma, ou se determina, no jogo conflituoso (dos incentivos e das
barreiras) com outras coisas.
No jogo de quê com quê? De algo que recebeu
diversos nomes: no jogo de “forças”, de “esforços”, de “afirmações causais”, de um
“princípio de prazer”, de uma “vontade de potência”, etc.
Por isso, o ego é o correlato de pelo menos um objeto:
“...ao passo que, de tempos em tempos, outras fontes [de sensações] lhe fogem – entre as quais se destaca a mais desejada de todas, o seio da mãe –, só reaparecendo como resultado de seus gritos de socorro. Desse jeito, pela primeira vez, o ego é contrastado por um ‘objeto’, sob a forma de que algo existe ‘exteriormente’ e que só é forçado a surgir através de uma ação especial.”*
A determinação do ego dá-se portanto sob o efeito de uma delimitação. Não é por nada que o apeiron de Anaximandro é ora traduzido como “o ilimitado, o infinito” ora
como “o indeterminado”. Determinação e delimitação (ou a finitude extrínseca)
seriam sinônimos.
Assim, não é espantosa a afirmação de que –
O ego seja um modo do apeiron.
Curiosamente, porém, quando o ego alcança a sua máxima determinação, na ilusão de que seu vir a ser é
autoconsistente e, assim, de que seu vir a ser é separado daquelas forças externas e limitadoras que, somente elas, fazem do ego
uma “consciência de si”, o ego perfaz de si mesmo a
falsa imagem (ou a falsa consciência) de que é semelhante ao apeiron.
“este [o livre-arbítrio, ou seja, a autodeterminação da vontade] nos torna, de algum modo, semelhantes a Deus, fazendo-nos mestres de nós mesmos, desde que não percamos por covardia os direitos que ele nos dá”**.
(*) FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Rio de Janeiro: Imago, 1997 [1930]. P. 13.
(**) DESCARTES, René. Les
Passions de l’âme. Paris: Le
Livre de Poche, 1990 [1649]. III, Art. 152. P. 141.
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