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História do futuro 4...



“Poucas coisas reforçarão mais a força fatal do impulso para o nomadismo que alastra do que as restrições à liberdade de circulação; nunca foi tão grande a discrepância entre a liberdade de movimentos e a abundância de meios de transporte.”


BENJAMIN, Walter. Rua de mão única [1928]. Trad. João Barrento. In: Rua de mão única; Infância berlinense: 1900. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. P. 22.

História do futuro 3...


“Mas não se trata das preocupações e dos sofrimentos de cada um, coisa que talvez se pudessem ajudar uns aos outros – é a observação do todo que ocupa a conversa. É como se estivéssemos presos num teatro e fôssemos obrigados a seguir a peça que se desenrola no palco, quer quiséssemos, quer não, e tivéssemos de fazer dela, quer quiséssemos, quer não, o objeto do nosso pensamento e do nosso discurso.”

BENJAMIN, Walter. Rua de mão única [1928]. Trad. João Barrento. In: Rua de mão única; Infância berlinense: 1900. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. P. 21.



História do futuro 2...


“Os alemães perderam definitivamente o mais europeu de todos os bens, aquela ironia mais ou menos evidente com que a vida de cada indivíduo se reclama alguma diferença em relação à existência da comunidade em que está inserido.”
BENJAMIN, Walter. Rua de mão única [1928]. Trad. João Barrento. In: Rua de mão única; Infância berlinense: 1900. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. P. 20.



História do futuro 1...



Trechos de Walter Benjamin sobre a “inflação alemã” tão aplicáveis à nossa “inflação” de hoje em dia:

Mas toda esperança será vã enquanto todos esses destinos terríveis e sombrios forem apresentados pela imprensa diariamente, de hora em hora, sempre com causas e consequências fictícias, não ajudando ninguém a reconhecer as forças obscuras a que a sua vida passou a estar submetida. 
BENJAMIN, Walter. Rua de mão única [1928]. Trad. João Barrento. In: Rua de mão única; Infância berlinense: 1900. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. P. 20.



A improdutividade contemporânea da política


Modernamente, as políticas de Estado são pensadas como despesa produtiva: como atividade que serve às condições da produção e à conservação da vida dominada.

Tem se tornado porém despesa improdutiva*, maldita, como o sacrifício, o luxo, o jogo ou a arte. 

Essa improdutividade da política então nos aproxima dos antigos?







(*) BATAILLE, Georges. La notion de dépense [1933]. In: La Part maudite. Paris: Minuit, 2011. P. 23 e sgt.

Já não devemos mais acompanhar as notícias


...elas nos prendem como capítulos de uma telenovela... não saímos mais do sofá... para nos tornarmos os eternos espectadores do teatro da política...

...as notícias se repetem, num ciclo amortecedor ou mortal... não são as notícias e os jornais que fazem a experiência de vida ou a história...


Para onde vamos?



A função política da crise do acontecimento é imobilizar a potência de pensar. Projeto niilista: o real se torna impensável; a dominação é facilitada. Já não é preciso governo.


Pensamento e crise


O acontecimento não é a crise do pensamento nem da ação. A crise do acontecimento é a incapacidade de julgar ou de determinar, definir, parar o pensamento, não de pensar. Justamente é a partir dos impasses de fora que se constitui e se intensifica o pensamento de fora, a modificação indefinida do pensamento, da potência de pensar, da potência de agir.

Não há modo de ser fora do pensamento, mas há o modo de ser do pensamento de fora. “De fora” não indica um objeto do pensamento, mas um modo, uma modificação, do pensamento.




Duas determinações cruzadas do horizonte


1) Plano frontal: anterior-posterior. O horizonte não se deixa jamais apreender objetivamente. Não há conceito-objetivo de horizonte. Já que ele sempre circunda, está à frente, mas, também, sempre ao mesmo tempo, por trás. Revela de si um aspecto, e oculta, simultaneamente, outros.

2) Plano horizontal: acima-abaixo. O horizonte é o limiar do visível-inteligível. Marca o limite entre o que se manifesta (acima do horizonte) e o que permanece latente (abaixo do horizonte, invisível, impensável)

O horizonte é propriamente o cruzamento desses dois planos.


Pontes ou muros entre as américas? Um experimento de fisiologia...


A ideia de que um muro ou uma ponte possa separar ou unir os espíritos de dois povos é uma ideia política originada da fisiologia(*) – portanto, é uma velha biopolítica. E, da fisiologia coletiva, que considera um povo como a união entre uma mente e um corpo formados pelas muitas mentes e corpos individuais dos seus membros.

Essa crença fisiológica, a ser comprovada, aparece nesse enunciado de um experimento possível: “Se o cérebro de um homem pudesse ser dividido com uma faca em duas partes e cada uma delas continuasse a funcionar, sua consciência seria então dividida em duas consciências; e, inversamente, se uma ponte funcional de matéria nervosa pudesse ser estabelecida entre os cérebros de dois humanos, sua consciência iria se fundir em uma única consciência.”**



* “FISIOLOGIA. Propriamente, estudo das funções dos corpos vivos [...] – por extensão, diz-se algumas vezes dos estudos da funções mentais; mas, em geral, para dar a entender que essas funções, se fossem mais conhecidas, seriam aquelas do sistema nervoso”. LALANDE, André. Vocabulaire technique et critique de la philosophie. 2 ed. Paris: Quadrige/PUF, 2006 [1926]. P. 780.

(**) MCDOUGALL, William. The Group Mind. 2 ed. London: Cambridge University Press, 1927 [1920]. P. 33.


Consciência Frankenstein: ponte ou muro?


As investigações das relações entre indivíduo e coletividade parecem requerer a urgência de ousados experimentos. Indivíduos que vivem em grupo formam uma nova consciência ligada ao corpo coletivo formado pelas relações físicas entre os corpos individuais? E nós mesmos, os indivíduos, somos mesmo indivisíveis? Podemos imaginar...

“Se o cérebro de um ser humano pudesse ser dividido com uma faca em duas partes e cada uma delas continuasse a funcionar, sua consciência seria então dividida em duas consciências; e, inversamente, se uma ponte funcional de matéria nervosa pudesse ser estabelecida entre os cérebros de dois humanos, sua consciência iria se fundir em uma única consciência.”*

Disso dependem a construção de uma ponte e a construção de um muro.



(*) MCDOUGALL, William. The Group Mind. 2 ed. London: Cambridge University Press, 1927 [1920]. P. 33.



A corrida do ouro


Ali onde quase já não havia ninguém “de repente preteja de gente”*. A corrida do ouro atual é a corrida religiosa. O fundamento desse curso é positivo ou negativo.

Provavelmente negativo. A corrida é uma fuga, se dá por “horror vacui – o medo diante do vazio governa essas pessoas”**. Vazio aberto no coração da emancipação humana pelo individualismo clássico e aprofundado, nos últimos decênios, pelo neoliberalismo.

Provavelmente não positivo, como desdobramento no real de um princípio efetivo positivamente existente, como por exemplo aquele “sentimento oceânico”*** de que falou Romand Rolland a Freud.





(*)CANETTI, Elias. Massa e poder. 4ª reimpressão. Trad. Sérgio Tellaroli. São Paulo: Companhia das Letras, 2013 [1960]. P. 14.

(**)KRACAUER, Siegfried. Aqueles que esperam. Trad. Carlos Eduardo Jordão Machado, Marlene Holzhausen. In: O ornamento da massa. São Paulo: Cosac Naify, 2009 [1963]. P. 152.

(***)FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização [1930]. Trad. Paulo César Lima de Souza. In: Obras completas. Vol. 18 (1930-1936). São Paulo: Companhia das Letras, 2010. P. 15.

Prisão II – metonímia


até a boca ocupar o nome do rosto todo
até falar só da prisão em lugar da cidade

...construir mais presídios...



Prisão


Já pensamos, com Freud, a origem oral dos juízos morais, aqueles acerca do bom e do mau. Por seu lado, Canetti persegue a origem do poder a partir da captura e da incorporação. Desta última um dos estágios é a oralidade. “Os dentes são os guardiões armados da boca. Esta, sendo um espaço realmente exíguo, constitui o modelo de todas as prisões”*. Para Canetti, portanto, a prisão é a boca desdobrada como aparelho de poder; as grades são o desdobramento dos dentes.

A palavra “oral” nos vem do latim oris (genitivo de os). Oris é isso que é da boca, que é pertinente à boca. Os, a boca, mais tarde, assume, no latim, por metonímia, o sentido do rosto todo – assim como no francês gueule diz boca ou rosto. Os Gorgonis é a boca ou a cara horripilante de Medusa**. A boca sobressai no rosto, a tal ponto que o rosto todo se resume à boca (veja aqui uma imagem disso).

Por meio da oralidade, se compreende a vinculação da moralidade com o poder, afinal: “Tudo o que se come é objeto do poder”**.

Leva-se à boca o que é bom; mas, à prisão, o que é mau. – Se a boca é o modelo para a prisão, o bom, de certa forma, também é modelo para o mau. A prisão é, como aparelho de poder, um pôr para dentro; e, como aparelho moral, um pôr para fora.

Para o poder, a prisão está cheia de maus humanos. Mas humanos têm bocas. A prisão está cheia de bocas. Presos são decapitados. Cabeças (ou bocas) de Medusa jazem inertes, cortadas, como troféus. Cortar a cabeça é cortar o pênis e a boca****, símbolos do poder.

Canetti é exato na distinção real entre boca e prisão. A boca remete à força. A prisão, ao poder. Entre poder e força, entre prisão e boca, uma certa “ampliação do espaço e do tempo”*****. Como a brincadeira do gato com o rato é um exercício de poder, não exatamente de força.

Quando a prisão mata, ela é boca, o poder é força.



(*) CANETTI, Elias. Massa e poder. 4ª reimpressão. Trad. Sérgio Tellaroli. São Paulo: Companhia das Letras, 2013 [1960]. P. 207.

(**) Para Freud, esse horror está ligado ao temor masculino de que a vagina seja uma boca, que ela possa morder. Mas esse temor aparece junto com o desejo sexual. “A visão da cabeça de Medusa torna rígido de terror” e de desejo. É talvez a vagina da mãe: desejada e interdita. FREUD, Sigmund. A cabeça da Medusa [1922]. Trad. Paulo César Lima de Souza. In: Obras completas. Vol. 15 (1920-1923). São Paulo: Companhia das Letras, 2011. P. 327.

(***) CANETTI. Op. Cit.  P. 218.

(****) Conferir: FREUD, Sigmund. Uma relação entre um símbolo e um sintoma [1916]. Trad. Paulo César Lima de Souza. In: Obras completas. Vol. 12 (1914-1916). São Paulo: Companhia das Letras, 2011. P. 291.

(*****) CANETTI. Op. Cit. P. 282.

Perdemos todos os nossos guias!


Sem guias, sentimo-nos perdidos? Atenção, pois será uma perdição ainda maior clamar por um líder! O perigo não é viver perdido, mas não saber viver sem um guia.

Leiamos o que escreveu, em 1931, o jornalista Hans Zehrer, fundador do Círculo Tat (Tatkreis) de intelectuais e outras pessoas da classe média alemã:
O anseio por este indivíduo [o líder, der Führer] está latente no povo há mais de uma década. Nós não queremos nos iludir: no momento em que a primeira palavra de comando severa, mas justa, de uma vontade realmente pessoal atingir o povo alemão, as pessoas entrarão em formação e cerrarão fileiras [...] e este respirará aliviado, pois saberá novamente para onde está indo.
H. Z. apud KRACAUER, Siegfried. O ornamento da massa. Trad. Carlos Eduardo Jordão Machado, Marlene Holzhausen. São Paulo: Cosac Naify, 2009. P. 132.



Ou é polícia, ou é ladrão!


Naquela brincadeira de crianças, só há dois modos de ser: ou se é polícia, ou ladrão. Entramos nessa brincadeira?




Toda nudez será castigada


Escrito em algum lugar (não importa onde), em torno a Nelson Rodrigues e aos anos 1960: ...“uma sociedade corrupta, dominada pela hipocrisia, despreparada para os desafios da modernidade”.




Psico-político-análise: a nudez brasileira




Problematizar


A filosofia, ou seja, o pensamento especulativo, não tem o compromisso de desprender da experiência os seus conceitos, mas procura forjar os conceitos capazes de abrir a experiência ao pensamento. Abrir a experiência ao pensamento quer dizer tornar a experiência, e isso que acontece numa experiência, um campo plástico para a atividade de pensar, um campo problemático. Fazer da experiência um problema, isso é abrir a experiência ao pensamento.