Metafísica da língua II – obediência e alteridade

_A língua nos permite dizer o que não podemos pensar.

Concordamos que há na obediência, necessariamente, a ideia de alteridade. Na obediência, há sempre um outro que comanda. Não se obedece a uma lei ou a uma ordem dada por si mesmo.

Obedece-se a uma ordem. “A obediência é uma a ção executada a partir de uma ordem. Certamente, a obediência tolhe a liberdade de algum modo”*. Pois, o essencial da ordem é que ela “provém, de algo estranho àquele que a recebe”**.

Contudo, na linguagem é correto dizer: “Eu me obedeço”. Nessa possível obediência a si, fica suprimida, ou é tornada insconsciente, a exigência de uma alteridade imperante. Já que a gramática, por outro lado, coíbe a diferenciação entre a referência objetal do “eu” e aquela do “me”.

Com a ocultação da mediação da alteridade na obediência a si, a moral pode, inconscientemente, se tornar uma ética da liberdade.







(*) SPINOZA, Benedictus de. Oeuvres III: Traité théologico-politique. Trad. Jacqueline Lagrée et Pierre-François Moreau. Paris: PUF, 2009 [1670]. XVI, §10. P. 519.

(**) CANETTI, Elias. Massa e poder. 4ª reimpressão. Trad. Sérgio Tellaroli. São Paulo: Companhia das Letras, 2013 [1960]. P. 305.

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