Razão-facão


Os primeiros Aufklärer tiveram essa ideia “iluminada” de que um complexo supersticioso (fabrica imaginária) encobria a realidade à percepção humana. Para eles, nós, o vulgo, percebemos o real como que através de nuvens, esses vapores intricados da superstição.

Eles pretendiam usar a faculdade humana da razão para limpar a sua via de acesso ao real (como fosse um facão, desbastando-lhes o caminho através das florestas dos seus novíssimos impérios coloniais).

O real, para esses esclarecidos, era como um fundo permanente, sempre ali, acessível ao intelecto corrigido, livre das superstições.

Mas, com efeito, o que é esse real cru? O que é esse fundo permanente de realidade livre de imaginação? O que é essa carne viva? Se desbastamos todas as excrescências imaginárias que obstruem (ou constituem) nosso regime mental, afinal, o que nos resta?

O que aqueles esclarecidos e velhos europeus atingiram ao final de sua empresa de desvelamento da realidade? Não estão eles, ainda, e como todos, intrincados em sua própria fabrica? A realidade não é esse princípio mesmo da fabricação?



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