Definição de uma vida

Uma vida é o nome da duração de uma existência, da existência de um corpo que, enquanto dura, deseja (e não pode desejar o contrário) afirmar essa existência, ou seja, deseja a si mesmo na relação com outros corpos.

Não precisamos apelar, nesta definição de uma vida, para categorias biológicas. Então uma vida já não é um critério de recorte entre os seres (vivos e não-vivos). Todo corpo (ou alma) vive enquanto dura. Todo o ser vive.

Um corpo, sendo ao mesmo tempo uma alma, pode não ser o objeto da biologia.

Faço um convite para que retiremos nossas lentes biológicas, ao fazermos a leitura dos dois textos seguintes.

O de Dickens (Our mutual friend, cap. III)...
Ninguém tem a mínima consideração pelo homem [trata-se de Riderhood]: com todos eles, ele tem sido objeto de repúdio, suspeita e aversão; mas a fagulha da vida dentro dele é curiosamente separável dele mesmo, e eles têm profundo interesse nisso, provavelmente porque aquilo é vida, e eles estão vivos e devem morrer.

Veja! Um sinal de vida! Um indubitável sinal de vida! A fagulha pode queimar-se e exaurir-se, ou ela pode inflamar-se e expandir-se, mas veja! Os quatro rudes comparsas, vendo-a, derramam lágrimas. Nem Riderhood neste mundo nem Riderhood no outro poderiam arrancar lágrimas deles; mas uma alma humana combatente, entre os dois, pode fazer isso facilmente.

... e este de Faulkner (Palmeiras selvagens, p. 155):
[...] falando com ninguém tanto quanto o grito de um coelho moribundo não se dirige a nenhum ouvido mortal, mas é sim uma acusação a toda a vida, e à sua loucura e sofrimento, à sua infinita capacidade de loucura e dor, que parece ser sua única imortalidade [...]

A biologia aqui não nos faz falta.

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